Souza Junior: Revisitando a Reflexologia Soviética

Do ponto de vista de autores como Canguilhem (1977), Pavlov (1924/1984), Pessotti (1976) e Skinner (1969/1984), é no trabalho de René Descartes (1596-1650) que encontramos a gênese da moderna concepção de reflexo. Tendo uma sólida base nos trabalhos de vivisseção e descrições anatomofisiológicas de Galeno (131-200 d.C.), Descartes inaugura uma nova forma de conceber os meandros das origens do movimento muscular, adotando uma concepção externalista e não metafísica da gênese do movimento, pelo menos naqueles movimentos por ele categorizados como automatismos. Apesar de haver utilizado conceitos já presentes em autores que o precederam, a distinção da posição cartesiana para as demais está no fato de utilizar, pela primeira vez, o termo “reflexo” (esprits réfléxis), tendo, inclusive, antecipado uma concepção da aprendizagem reflexa análoga à teoria dos reflexos condicionados, proposta por Ivan Pavlov, séculos mais tarde (PESSOTTI, 1976: 12-13).

A história da fisiologia dos reflexos percorreu uma trajetória que teria ainda muitos nomes de destaque em momentos anteriores ao século XIX, como Thomas Willis (1621-1675) e Robert Whytt (1714-1766), embora os avanços mais notáveis tenham acontecido a partir do início do século XIX, destacando-se as figuras de Charles Bell (1774-1842) que, em 1811, postula que as inervações medulares anteriores e posteriores exercem funções distintas. François Magendie (1783-1855), em 1822, confirma a tese de Bell experimentalmente. Em 1832-1833, Marshall Hall (1790-1857) descreveu a doutrina da chamada “ação reflexa”. Johannes Müller (1801-1858) publica seis trabalhos sobre os movimentos reflexos em 1833. Rudolph Wagner (1805-1864) propõe um primeiro esquema descritivo para o fenômeno conhecido como “arco reflexo”[1] (CANGUILHEM, 1977). Todas essas perspectivas precederam os modernos estudos de fisiologia desenvolvidos ainda no século XIX por pesquisadores russos, sendo este o conjunto de investigações de maior interesse para a presente análise. Todos estes pensadores e escolas compuseram um movimento que convergiu progressivamente rumo a um enfoque experimentalista e oposto às explicações ditas idealistas da gênese dos movimentos reflexos.

A seguir, serão descritos os principais desenvolvimentos do campo de estudos conhecido como Reflexologia Soviética[2] no século XIX, por meio da exploração do trabalho dos seus representantes mais conhecidos. Esta revisão será empreendida com o intuito da construção de um novo olhar sobre um campo de estudos de grande influência durante todo o século XX e cujas discussões históricas parecem, ainda, abertas.

Souza Junior, Eustáquio. Revisitando a reflexologia soviética. Mnemosine, Vol. 5, No 2, 2009. http://www.mnemosine.cjb.net/mnemo/index.php/mnemo/article/view/362/590


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